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Sex Education: O prazer da mulher e o tabu masturbação na Série da Netflix.

Por Emmanuelle Camarotti, CRP 07/31865

Sex Education é uma série criada por Laurie Nunn e exibida pela plataforma Netflix. A série retrata a vida do adolescente Otis, filho de uma sexóloga, que ao conhecer Maeve, decidem abrir uma clínica de terapia sexual para seus colegas de escola.

Conforme nós vamos conhecendo os personagens, são inevitáveis as identificações com uma partezinha de cada personagem, afinal, todos nós já fomos adolescentes e já tivemos muitas curiosidades e dúvidas a respeito do nosso próprio corpo e sobre sexo.

O personagem que quero enfatizar aqui é a Aimee. Ela é uma menina doce e engraçada, que faz parte do grupo popular da escola. Após o término do seu namoro com Adam, Aimee conhece Steve, o novo aluno da escola, e eles começam a namorar. No episódio seis da primeira temporada, Aimee e Steve estão transando e ela se mostra performática durante a relação. Ao repetir frases que parecem ter saído de um filme pornô, Steve a questiona se ela realmente quer o que está pedindo e confessa que está percebendo que ela está fingindo sentir prazer, questionando-a sobre o que ela realmente quer e gosta. Esta pergunta faz com que a adolescente perceba que ela não faz a menor ideia do que gosta durante o sexo.

Este é o momento no qual Aimee faz uma consulta com Otis e ele a orienta sobre pensar nas coisas que ela gosta de fazer quando está sozinha. A reação de Aimee é a realidade de muitas mulheres. Aimee não se masturba pois acha nojento. A continuação da cena é Otis falando que é normal que as mulheres se sintam culpadas por se masturbarem, pois acham que é algo feio ou tabu.

Pois bem, de fato, o sexo carrega um certo tabu consigo e quando é voltado ao corpo da mulher, esse tabu com certeza se manisfesta. O pensamento de Aimee reflete o pensamento de muitas mulheres que, ao longo da vida, não conhecem seus corpos e acabam nunca experimentando uma relação verdadeiramente prazerosa.

Ainda no episódio seis, Otis orienta que Aimee se masturbe para entender o que funciona melhor para seu corpo e o resultado é uma descoberta de um novo universo que respeita suas vontades, particularidades e desejos. Aimee descobre como tocar em si mesma, como quer ser tocada e mais do que isso, ela descobre que ao explorar seu corpo, ela pode proporcionar prazer a si mesma.

O fato de muitas mulheres terem vergonha ou nojo de se masturbar, é o reflexo de anos de uma cultura que não permite que a mulher conheça seu corpo em suas nuances, pois ele pertencia ao marido e o sexo tinha como principal objetivo a procriação ou proporcionar prazer ao marido.

Quando séries como Sex Education mostram uma adolescente se masturbando e tratando o assunto como algo que faz parte do processo de amadurecimento da vida, nós, enquanto sociedade, começamos a trilhar o caminho de encorajar outras mulheres a conhecerem e terem o controle de seu corpo sem que ela seja julgada por isso. Quando uma mulher conhece seu corpo, ela percebe suas mudanças, seus ciclos, suas potencialidades e o que precisa ser cuidado. A mulher se torna protagonista de algo que lhe foi tolhido por muito tempo.

Conhecer o próprio corpo não precisa que seja, necessariamente, através da masturbação, mas, certamente, passará por essa etapa, pois sexo não é apenas um ato que gera prazer, é também um momento de trocas, de respeito aos seus desejos e ao desejo do outro, entre outras várias representações. Quando uma mulher aprende que seu ciclo menstrual pode interferir em sua rotina, também estamos falando sobre conhecimento do corpo. Quando entendemos que não precisamos seguir um padrão social de beleza ao ponto de fazer transformações irrevogáveis, aprendemos a valorizar o que o corpo tem de mais bonito. Aprendemos a respeitar os processos pelos quais o corpo passa e, sobretudo, respeitamos a nós mesmas.

Além de falar sobre autoconhecimento, a série exibe uma questão importantíssima para todo e qualquer ser humano: o consentimento. Perguntas como: “posso tocar em você?”, “posso te beijar?”, “o que você gosta (no sexo)?”, aparecem de uma forma muito natural e fluída e traz inúmeras reflexões sobre a necessidade de ensinar às crianças e adolescentes os limites de seus corpos e do corpo alheio.

Tudo isso, passa pela conversa, pela troca de saberes. O tabu só é tabu, porque as pessoas não falam sobre ele. Quando um tabu se instaura, abre margem para que crenças irreais tomem lugar da verdade, que rituais sem sentido assumam o lugar daqueles que ajudariam as pessoas.

Sex Education é uma série sobre aprender a respeito de si mesma e aprender que todos nós estamos travando nossas próprias batalhas, mas que não é necessário estar sozinha nessa trajetória. O fato de a série ter classificação indicativa de 16 anos, permite que haja maior liberdade ao expor determinados assuntos, mas isso não quer dizer que não seja permitido conversar com adolescentes e crianças sobre suas curiosidades a respeito de seus corpos, só será necessário adaptar a linguagem dessa conversa de acordo com a idade.

Lembremos: tabus não tornam uma sociedade melhor, muito pelo contrário. Eles favorecem o surgimento de mitos e ideias que têm o poder de retroceder anos de conhecimento científico e desenvolvimento social.

Emmanuelle Camarotti é psicóloga clínica de casais e famílias (CRP07/31865) Pós graduanda em Aspectos Diagnósticos e Terapêuticos das Disfunções Sexuais, participou do criação do aplicativo Amar É e desenvolve um trabalho focado em mulheres a partir do ciclo menstrual no Instagram @eumulherciclica.

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